Certa vez tive uma agradável conversa com os amigos Andrea Schwarz e Jaques Haber, proprietários da Consultoria i.Social, sobre os novos modelos de negócios relacionados direta ou indiretamente ao mercado de pessoas com deficiência e mobilidade reduzida. Concordamos com o fato de que as pessoas com deficiência à frente desses negócios (como é o caso da Andrea, que é cadeirante) devem separar muito bem o lado profissional do engajamento social. Mesmo porque, esse engajamento pode ser devidamente canalizado por meio da atuação em instituições, Organizações Não Governamentais (ONG’s), comissões, conselhos e até mesmo órgãos públicos.Business is business (negócios são negócios). Se os executores desses projetos não possuírem qualificação profissional e conhecimento técnico sobre suas respectivas áreas, não serão as suas características físicas e a militância social que garantirão o sucesso do negócio.
Além das pessoas com deficiência que desenvolvem modelos de negócios baseados ou não em suas experiências pessoais, temos os chamados empreendedores sociais, que reconhecem demandas e gargalos da sociedade e desenvolvem ferramentas inovadoras para resolvê-los com o foco no chamado capital social, que visa o bem comum em detrimento do retorno financeiro. Embora não haja nenhum problema com um modelo de empreendimento social que tenha esse fim. Além disso, ainda temos as chamadas “empresas sociais”, modelo ainda pouco difundido no Brasil, que mescla o padrão convencional de uma empresa, porém com o foco no trabalho compartilhado, visando tanto o benefício social, quanto a sustentabilidade do negócio. Bom, mas o que eu gostaria de discutir aqui são as novas perspectivas de uma economia criativa para as pessoas com deficiência, fomentada por meio da Web 2.0.
Sem muitos tecnicismos e o exagero na utilização de termos “moderninhos”, a Web 2.0 é a internet dos tempos atuais. Ao contrário da internet que vimos surgir em meados da década de 1990, onde não havia nenhum tipo de interatividade e participação coletiva, o atual formato, segundo Guilherme Felliti, repórter do IDG Now, revista Carta Capital e especialista em modelo comercial de serviços colaborativos, “usa a web como plataforma de socialização e interação entre usuários graças ao compartilhamento e criação conjunta de conteúdo”. É exatamente aí que manifesto a minha convicção de que a Web 2.0 pode ser utilizada como uma ferramenta de empoderamento das pessoas com deficiência, que tem nesse modelo a possibilidade de contribuir para a criação de uma nova economia, baseada na interatividade, no engajamento e na troca constante de informações.
São inúmeras as possibilidades! As próprias pessoas com deficiência podem e devem se fazer valer da inteligência coletiva para desenvolver e aperfeiçoar produtos e serviços de tecnologia assistiva e acessibilidade – em todas as suas dimensões. Um excelente exemplo, embora oriundo de uma instituição sem fins lucrativos, é o Instituto Rodrigo Mendes, que trabalha com o foco na promoção da educação inclusiva. Recentemente eles lançaram um programa chamado “Diversa”, que é uma plataforma de troca de experiências e construção de conhecimento sobre educação inclusiva por meio de estudos de caso, vídeos e relatos de experiências de secretarias de educação espalhadas por todo o país. Qualquer pessoa pode colaborar de maneira ativa, publicando comentários e deixando sugestões. Isso é web 2.0 inclusiva!
Ou seja, temos diante de nós a possibilidade de mesclar o engajamento e a participação social com a criação de novos modelos de negócios. E o que realmente pode “gerar valor” a esses modelos, são exatamente as demandas criadas pelas próprias pessoas envolvidas que, em nosso caso, não são apenas as pessoas com deficiência, mas também os seus familiares, profissionais, estudantes, empresas, curiosos, etc, etc, etc. Em linhas gerais, temos de um lado os sites das empresas do segmento, que promovem a venda (ou simplesmente o anúncio) de seus produtos e serviços de tecnologia assistiva, acessibilidade e inclusão, enquanto que de outro, temos as redes sociais (twitter, facebook, orkut, linkedin), os blogs, chats, etc, “bombando” de informações e troca de experiências.
A proposta da Usina da Inclusão é unir essas duas pontas e criar algo novo – uma plataforma de conteúdo colaborativo em que empresas do segmento de tecnologia assistiva, acessibilidade e inclusão possam compartilhar seus produtos e serviços gratuitamente, ao mesmo tempo em que todos os visitantes do site possam interagir, disponibilizar conteúdo, deixar comentários e sugestões, além de dar notas aos produtos e serviços expostos. Esperamos criar um modelo de negócio em que, por meio da colaboração coletiva, sejam fomentadas novas idéias e criadas novas demandas que melhorem a qualidade de vida as pessoas com deficiência.
Afinal de contas, estamos falando de um público de mais de 45 milhões de brasileiros, segundo dados do Censo IBGE 2010. É mais do que toda a população da Argentina! Temos aí um nicho de mercado que, somente em 2011, movimentou mais de 1,5 bilhões de reais em bens e serviços de tecnologia assistiva no Brasil! E a projeção para 2012 é de elevação de 20% do faturamento. Os dados são do Grupo Cipa Fiera Milano, organizador da Feira Internacional de Tecnologias em Reabilitação, Inclusão e Acessibilidade (Reatech).
Está mais do que na hora dos empreendedores brasileiros (sociais ou não) entenderem na essência a máxima “Nada sobre nós, sem nós”, famosa frase do movimento de pessoas com deficiência, e “explorar”, no melhor sentido da palavra, o quanto eles podem contribuir e o que eles tem a nos dizer!
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