O vídeo começa com uma imagem de um neurônio espectral cinza. Uma onda de lampejos vermelhos em um dos braços da célula do cérebro desaparece, depois retorna, descendo pelo cacho até o núcleo da célula e enchendo-a de cor.
A filmagem captura um disparo de neurônios, permitindo que os pesquisadores vejam o sinal fluindo através de toda uma célula pela primeira vez. Ver essas células funcionando pode possibilitar que os pesquisadores monitorem e meçam a atividade cerebral, incluindo padrões de disparo de células afetadas por desordens como epilepsia ou esclerose múltipla.
O vídeo, publicado on-line no jornal Nature Methods em junho, mostra um novo método para converter a atividade elétrica em luz fluorescente. Essa tecnologia incipiente foi descoberta pelo neurocientista Adam Cohen, da Universidade de Harvard, um novaiorquino de 35 anos com dois doutorados no currículo. Empresas farmacêuticas como a Biogen Idec Inc. e a GlaxoSmithKline Plc já se prontificaram a colaborar com a firma de biotecnologia de Cohen, a Q-State Biosciences, esperando avançar no desenvolvimento de medicamentos.
"Conseguir um bom sensor de voltagem foi o santo graal desse campo nos últimos 40 anos", disse Michael Hausser, neurocientista da University College London que não esteve envolvido no projeto de Cohen. "Os sinais são a linguagem do cérebro -- se você tem um bom sensor, ele abre um mundo completo de experimentos diferentes e, potencialmente, de novas terapias".
Almôndega, espaguete
O trabalho de Cohen é baseado em um organismo unicelular do Mar Morto, o Halorubrum sodomense, que tem uma proteína que converte luz em energia. Embora proteínas similares tenham sido usadas por outros pesquisadores para estimular com luz os cérebros de ratos, Cohen teve uma ideia diferente: será que ele poderia fazer a proteína funcionar ao contrário para que ela sentisse a eletricidade e a transformasse em luz?
Se sua ideia funcionasse, os pesquisadores poderiam visualizar a atividade elétrica em neurônios, as células que são componentes-chave do cérebro, na medula espinhal e no sistema nervoso central.
Daniel Hochbaum, estudante de pós-doutorado no laboratório de Cohen, compara um neurônio com uma almôndega com fios de espaguete. Com a atual tecnologia, os cientistas podem monitorar a atividade elétrica apenas no núcleo do neurônio -- a almôndega -- introduzindo sondas cuidadosamente ou injetando corantes com minúsculas pipetas de vidro, um processo que é lento e delicado e permite que os pesquisadores monitorem apenas uma célula por vez.
Com as proteínas de Cohen, contudo, as mudanças de voltagem são monitoradas em todo o neurônio, até nos minúsculos braços -- os fios de espaguete -- que as sondas não conseguem penetrar. É ainda mais eficiente: em um microscópio, o laboratório de Cohen pode ver dezenas de neurônios em uma placa de petri dispararem conjuntamente.
Trocando em miúdos, "você pode jogar os eletrodos fora", disse Hausser.
Quando a notícia de seu trabalho se espalhou, Cohen foi assediado por pedidos de pesquisadores que queriam colaborar com ele. Ele iniciou o Q-State em abril de 2013 para criar uma plataforma para essas parcerias e desde então tem se envolvido em discussões com aproximadamente "todas as grandes empresas farmacêuticas do mundo", disse ele. Ele disse que não pode citar a maioria delas porque as parcerias são privadas.
Segurança cardíaca
A empresa de biotecnologia Biogen é um desses clientes. A Biogen, que assim como Harvard tem sede em Cambridge, Massachusetts, é especializada em doenças neurológicas como a esclerose múltipla, que afeta cerca de 3,2 milhões de pessoas em todo o mundo e não tem cura. A empresa preferiu não dar detalhes sobre em que está trabalhando com Cohen.
A fabricante de medicamentos GlaxoSmithKline, com sede em Londres, também pediu que Cohen a ajudasse a estudar a segurança cardíaca observando a atividade elétrica no coração.
Se Cohen puder ajustar os níveis necessários de luz, algum dia os cientistas poderão até mesmo ser capazes de visualizar a atividade elétrica em humanos, simplesmente emitindo luzes através do crânio, disse Hausser. "Todos têm esperanças de que ele tire a sorte grande".
Título em inglês: Harvard Scientist Lights Up Neurons to Find Brain Cures: Health
Para entrar em contato com o repórter: Caroline Chen, em Nova York, cchen509@bloomberg.net.